Educação da criança surda
A educação é fulcral no crescimento da pessoa. A educação da criança surda é um direito, faz parte da sua condição como ser humano e o dever de educar é uma exigência do adulto, do pai e do educador.
Para a criança surda, tal como para a criança ouvinte, o pleno desenvolvimento das suas capacidades linguísticas, emocionais e sociais é uma condição imprescindível para o seu desenvolvimento como pessoa.
O ensino da Língua Portuguesa
[editar | editar código-fonte]A linguagem é essencial à vida em comunidade, pois é através dela que partilhamos ideias, emoções, experiências. Sem a linguagem as nossas potencialidades como ser humano ficam muitíssimo reduzidas.
No caso dos surdos oralizados, a escolarização envolve também sessões com fonoaudiólogos, leitura labial, uso de equipamentos para facilitar a comunicação e a participação ativa dos pais.
Mas o mesmo não acontece com uma porcentagem dos surdos cuja principal língua utilizada é a língua gestual, logo, para eles o conhecimento da escrita implica a aprendizagem de uma nova língua. Surgem então dois desafios:
- Criação de condições que permitam o pleno desenvolvimento da criança;
- Criação de condições que permitam a sua aptidão para interagir em diversos sistemas sociais e linguísticos: na comunidade de surdos e na comunidade ouvinte.
O sucesso escolar depende, em grande parte, do domínio da língua de escolarização. Além disso, a linguagem escrita é a modalidade de comunicação mais facilmente partilhável por surdos e ouvintes.
Como ensinar o surdo sinalizado a ler?
[editar | editar código-fonte]A criança com bom domínio da língua gestual tem vantagem, quando chega à escola.
Há três tipos de ambientes de aprendizagem:
- Centrada no aluno - experiência linguística, hábitos literácitos da família, atitudes e valores;
- Ancorada na avaliação - progresso do aluno, comparação com pares;
- Referenciada ao conhecimento - autonomia e fluência da leitura; desenvoltura e correcção no uso multi funcional da escrita; conhecimento da estrutura da Língua Portuguesa.
Descoberta das letras
[editar | editar código-fonte]Começar por criar noção de que:
- nomes diferentes começam por letras diferentes;
- sequências de letras diferentes resultam em palavras com significados diferentes;
- é possível corresponder a letra a algo que ela representa – dactilologia;
- criar consciência de que movimentos articulatórios estão na base de determinado som.
Com isto temos o objectivo que a criança surda saiba que:
- unidades mínimas são diferentes entre si;
- a sua presença altera o significado da palavra;
- letra é a representação de um som (nas línguas orais onde se aplica esta regra);
- letras têm nome.
Estas noções podem ser criadas com ajudas tais como o computador, desenhos, livros, entre outros que o educador julgue útil para a especificidade do caso em questão.
Descoberta da natureza da linguagem escrita
[editar | editar código-fonte]A fim de que a criança vá interiorizando a escrita devem ser criadas algumas rotinas, com o objectivo de que a criança grave as seguintes noções:
- a escrita tem informação que é destinada a ser lida;
- essa informação é imutável;
- essa informação aparece em variados meios;
- sinais de escrita são distintos de outras produções gráficas;
- os mesmos organizam-se segundo padrões definidos.
Assim, é bom que o educador comece por ler histórias para a criança, com posterior tradução para a língua gestual. Após a leitura deve ser discutido o assunto lido.
Serve também de ajuda, neste assunto, que o educador ensine à criança como usar, por exemplo, o calendário, como identificar o seu nome (por descobri-lo por entre outras palavras), como reconhecer marcas comerciais.
Descoberta da existência de palavras
[editar | editar código-fonte]O educador deve desenvolver actividades para ensinar e estimular a criança a:
- reconhecer unidades de cadeias gráficas (palavras);
- perceber que as palavras têm significado;
- perceber que as palavras estão isoladas no texto, pelos espaços;
- saber onde começa e onde acaba a palavra;
- saber que palavras iguais têm o mesmo significado e gesto (sinal).
Aprendizagem da compreensão da leitura
[editar | editar código-fonte]A leitura é uma actividade cognitiva, o seu alvo é a obtenção de significado. Na Língua Portuguesa, a aprendizagem da gramática é difícil para qualquer aluno que esteja a aprender uma segunda língua, para o aluno surdo também, especialmente frases na voz passiva, o complemento indirecto, as orações relativas, as conjunções, artigos e os pronomes (para além de existir também dificuldades inerentes com o vocabulário).
A estrutura dos textos, qualquer que seja o seu objectivo (informar, divertir, persuadir o leitor), tem que ver com a forma como as ideias se organizam, com vista à clareza da exposição do conteúdo. Por isso, para diferentes tipos de texto, serão necessárias diferentes abordagens.
Perante os textos informativos é necessário que a criança aprenda, deste modo a:
- tomar atenção aos sinais de aproximação ao conteúdo, tais como o título, fotografias, imagens, entre outros;
- identificar o tema da informação;
- identificar a ideia principal.
Podem ser usadas algumas ajudas, como estratégias para o treinamento da compreensão deste tipo de textos, como por exemplo o questionamento do texto (O que sugere o título? O que o autor nos quer transmitir? Será que poderia existir um final diferente?), também a interpretação do texto para a língua gestual (com especial atenção às palavras-chave do texto, à qual devem sempre ser associados sinónimos, para uma melhor compreensão por parte do surdo).
Perante os textos narrativos, os objectivos a serem alcançados pelo surdo são:
- recorrer a imagens, esquemas e ilustrações como complemento da informação textual;
- identificar as etapas do processo temporal;
- identificar e compreender os verbos da acção;
- recorrer à consulta do texto sempre que a tarefa o requerer.
Para este tipo de texto podem ser utilizados os seguintes tópicos de ajuda: a elaboração do esquema da história, o reconto e revisão da história em língua gestual, a ilustração, e a tradução e revisão da história em texto escrito.
Existem, no entanto, contextos educativos que podem influenciar a compreensão da leitura, são eles: o contexto psicológico (tem que ver com a intenção da leitura), o contexto social (engloba as intervenções de professores e de colegas do meio escolar) e o contexto físico (inclui todas as condições materiais em que se desenrola a leitura).
Desenvolvimento social e emocional da criança surda
[editar | editar código-fonte]É por meio dos relacionamentos sociais que descobrimos o que é necessário para viver na sociedade. O primeiro contato social da criança é no meio familiar. Segundo Santana e Bergamo (2005),[1] os surdos foram durante muito tempo condenados por sua condição, considerados doentes, pela falta da comunicação oral e escondidos da sociedade pela sua família. A língua de sinais era proibida. Recentemente, a Língua Brasileira de Sinais (Libras) foi reconhecida como língua materna dos surdos, através da Lei Nº 10.436 de 24 de abril de 2002,[2] o que proporcionou aos mesmos um reconhecimento perante a sociedade. A aprendizagem social ou educacional, precisa de contribuições desde o nascimento da criança. A criança surda precisa ser compreendida pelas suas características e o relacionamento interpessoal familiar faz diferença no modo como essa criança irá se identificar enquanto parte das relações sociais. É importante para os surdos que as pessoas consigam comunicar-se com eles através da Libras, para que haja a inclusão social. Serviços básicos como saúde, educação e comércio em geral muitas vezes não possuem pessoas qualificadas para o atendimento ao surdo, fazendo com que ele se sinta ainda mais excluído. Portanto, a inclusão da Libras no cotidiano da sociedade seria indispensável para o desenvolvimento social do surdo.
Ver também
[editar | editar código-fonte]- Cultura dos surdos;
- Educação inclusiva;
- Educação especial;
- Interpretação para os surdos;
- Libras;
- LGP;
- Língua gestual;
- Surdez.
Referências
Notas bibliográficas
[editar | editar código-fonte]- Sim-Sim, Inês. A Criança Surda, contributos para a sua educação, textos de educação, Fundação Calouste Gulbenkian.