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Canto da Sibila

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O Canto da Sibila é um auto litúrgico baseado numa composição de canto gregoriano de origem medieval, pertencente ao tempo do Natal, outrora muito conhecido no sul da Europa mas que atualmente só sobrevive na tradição dos Países Catalães. O canto representa uma profecia da "Sibila" que descreve o Fim dos Tempos, a segunda vinda de Cristo e o Juízo Final. Em 2010, o "Cant de la Sibil·la" de Maiorca foi classificado como Património Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO.

Stefan Lochner: Juízo Final (c. 1435), Museu Wallraf-Richartz.

A versão mais antiga, datada dos séculos IXX, é o chamado "Canto da Sibila Latina" ou "Judicii Signum". A sua letra incorpora fragmentos retirados de um texto em latim no livro De Civitate Dei, que Santo Agostinho traduziu, imperfeitamente, de um poema acróstico em grego com o incipit Ἱδρώσει γὰρ χθών, κρίσεως σημεῖον ὅτ' ἔσται (Hidrṓsei gàr khthṓn, kríseōs sēmeîon hót' éstai)[1][2] Esta versão serviu de inspiração para variantes distintas que surgiram num processo de transmissão e reinterpretação:

Em Portugal, embora nunca se tenham encontrado versões traduzidas em português, subsiste uma versão do canto latino proveniente da Sé de Braga.[2][5]

Desconhece-se a origem deste tipo de cantos. A versão original, um canto gregoriano em latim, é uma adaptação musical de uma profecia atribuída à Sibila Eritreia, originalmente escrita em grego mas traduzida para latim por Santo Agostinho. A melodia foi, aparentemente, fortemente influenciada pelo canto moçárabe (também chamado hispânico), tradicional na Península Ibérica.[6]

Foi bastante popular durante a Idade Média no sul da Europa e subsistem alguns manuscritos que comprovam essa sua dispersão pelos atuais Portugal, Espanha, França e Itália. Cópias musicadas surgem a partir do século IX mas o canto só deve ter sido comum nos templos depois do século XII. Não existem evidências de que tenha sido dramatizado por essa altura. Esta versão deu origem a diversas traduções e adaptações em vernáculo nos séculos seguintes. A sua interpretação foi proibida pelas autoridades eclesiásticas no século XVI de acordo com o Concílio de Trento, mas o declínio foi, na maioria dos países bastante lento visto que o "Canto da Sibila" era ainda interpretado, por exemplo, em Toledo por volta do século XVIII e na Sé de Braga até ao século XX. Só nos Países Catalães o canto sobreviveu até à atualidade, com destaque para a ilha espanhola de Maiorca.[2][3]

Drama litúrgico de Maiorca

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Elementos relacionados com a impressão musical do Canto da Sibila de Maiorca

As primeiras adaptações para a língua catalã estão documentadas desde o século XIII. No mesmo século, deve ter chegado a Maiorca aquando da reconquista da ilha. No século XVI a proibição do Concílio de Trento foi inicialmente cumprida, contudo, o canto foi restaurado poucos anos depois, em 1575.[3] Hoje em dia as paróquias de Maiorca são os últimos locais que preservam uma tradição genuína do Canto da Sibila, recebendo por isso em 2010, da parte da UNESCO, a classificação como Património Cultural Imaterial da Humanidade.[3][7]

Segundo essa tradição sobrevivente, o auto é realizado na noite de 24 de dezembro no interior de grande parte das igrejas da ilha.[3]

A Sibila é tradicionalmente representada por um menino que canta sem acompanhamento instrumental (visto que estava vedado a mulheres o canto no interior dos templos e também não era autorizado o uso de instrumentos). Acompanhado de dois ou mais acólitos com velas, caminha até ao altar onde a “Sibila” faz reverência ao crucifixo e virando-se para a audiência começa o canto. Interlúdios musicais mais recentes, esses sim, com uso de polifonia e instrumentos, são frequentes. A “Sibila” segura na mão uma espada levantada enquanto canta e veste uma túnica, por vezes também uma capa e um chapéu.[3]

Michelangelo: Sibila Eritreia (1508-1512) no Teto da Capela Sistina.
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A Wikisource contém fontes primárias relacionadas com Versões catalãs do Canto da Síbila
Sibila Latina Sibila de Maiorca
Judicii signum: tellus sudore madescet El jorn del judici
parrà qui haurà fet servici.

E caelo Rex adveniet per saecla futurus
Scilicet in carnem praesens ut judicet orbem

Jesucrist, Rei universal,
home i ver Déu eternal
del cel vindrà per a jutjar
i a cada u lo just darà.

Gran foc del cel devallarà;
mar, fonts i rius, tot cremarà.
Los peixos donaran grans crits
perdent los naturals delits.

Ans del Judici l'Anticrist vindrà
i tot lo món turment darà,
i se farà com Déu servir
i qui no el crega farà morir.

Lo seu regnat serà molt breu;
en aquell temps sots poder seu
moriran màrtirs tots a un lloc
aquells dos sants, Elíes i Enoc.

Lo sol perdrà la claredat
mostrant-se fosc i entelat,
la lluna no darà claror
i tot lo món serà tristor.

Als mals dirà molt agrament:
– Anau, maleïts, en el turment!
Anau, anau al foc etern
amb vostron príncep de l'infern.

Als bons dirà: – Fills meus veníu!
Benaventurats posseïu
el regne que està aparellat
des de que el món va ser creat.

Oh humil Verge! Vos qui heu parit
Jesús Infant aquesta nit,
a vostro Fill vullau pregar
que de lo infern nos vulla guardar.[8]

Unde Deum cernent incredulus atque fidelis
Celsum cum sanctis aevi jam termino in ipso

Sic animae cum carne aderunt quas judicat ipse
Cum jacet incultus densis in vepribus orbis

Reicient simulacra viri cunctam quoque gazam
Exurent terras ignis pontumque polumque

Inquirens taetri portas effringet Averni
Sanctorum sed enim cunctae lux libera carni

Tradetur sontes aeterna flamma cremabit
Occultos actus retegens tunc quisque loquetur

Secreta atque Deus reserabit pectora luci
Tunc erit et luctus stridebunt dentibus omnes

Eripitur solis jubar et chorus interit astris
Volvetur caelum lunaris splendor obibit

Deiciet colles valles extollet ab imo
Non erit in rebus hominum sublime vel altum

Jam aequantur campis montes et caerula ponti
Omnia cessabunt tellus confracta peribit

Sic pariter fontes torrentur fluminaque igni
Sed tuba tum sonitum tristem demittet ab alto

Orbe gemens facinus miserum variosque labores
Tartareumque chaos monstrabit terra dehiscens

Et coram hic Domino reges sistentur ad unum
Recidet e caelis ignisque et sulphuris amnis[2]

Foram vários os grupos que realizaram gravações das diversas versões tanto na forma completa como fragmentária. Destacam-se a coleção de Jordi Savall com Montserrat Figueras e La Capella Reial de Catalunya que gravaram em 1989 e 1996 dois álbuns monumentais: "Cant de la Sibil·la" (com versões integrais da Sibila Latina, Sibila Provençal e Sibila Catalã) e "El Canto de la Sibilla II" (com versões integrais da Sibila Galaica e Sibila Castelhana).[9][10]

O "Canto da Sibila segundo a tradição bracarense" foi interpretado pelo grupo Vozes Alfonsinas.[6]

Referências

  1. Bergk, Theodorus (1866). Poetae Lyrici Graeci Tertiis curis (em latim). Poetas elegiacos et iambographos continens. Lípsia: Aedibus B. G. Teubneri. p. 454. cuius vaticinii primus versus est Ἱδρώσει γὰρ χθών κρίσεως σημεῖον ὅτ' ἔσται 
  2. a b c d e f g h Zapke, Susana (2007). Hispania Vetus. Bilbau: Fundação BBVA. p. 159 
  3. a b c d e f «Chant of the Sybil on Majorca (Nomination form)» (pdf). UNESCO. 2010. Consultado em 12 de dezembro de 2016 
  4. Andrew Casson. «Cantigas de Santa Maria for Singers» (em inglês). Consultado em 12 de dezembro de 2016 
  5. Ferreira, Manuel Pedro (2008). Antologia de música em Portugal na Idade Média e no Renascimento. Lisboa: Arte das Musas: Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical. ISBN 978-989-95983-0-0 
  6. a b Jorge Matta, Margarida Lucena Vale, Nuno Garcia e Vozes Alfonsinas (13 de setembro de 2008). «Música da Idade Média». Percursos da Música Portuguesa. RTP2 
  7. «Chant of the Sybil on Majorca». UNESCO. 2010. Consultado em 12 de dezembro de 2016 
  8. «Declaració com a Bé Immaterial d'Interès Cultural del cant de la Sibil.la» (pdf). Governo das Ilhas Baleares. 2005. Consultado em 12 de dezembro de 2016 
  9. «El Cant de la Sibil·la». Allmusic. Consultado em 12 de dezembro de 2016 
  10. «El Canto de la Sibila II: Galicia Castilla». Allmusic. Consultado em 12 de dezembro de 2016